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Entre Vinhedos e Veias: Traços Orientais na Reabilitação Esportiva e o Corpo que Se Reconstrói

  • Foto do escritor: FP Head de Comunicação
    FP Head de Comunicação
  • 24 de out.
  • 3 min de leitura
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Por Dóris Reis

O corpo de um atleta é um território em constante reconstrução. Cada músculo carrega a memória da superação, mas também as cicatrizes invisíveis da exaustão. A medicina esportiva ocidental, com sua precisão e técnica, aprendeu a tratar essas lesões com bisturis, ultrassons e protocolos milimétricos. Já a medicina oriental observa de outro modo: o corpo não como máquina, mas como jardim, onde a dor é o aviso de que algo deixou de florescer em harmonia.

Nos últimos anos, práticas como acupuntura, massagem tuina, yoga terapêutica e fitoterapia chinesa têm ganhado espaço em centros de reabilitação esportiva de alta performance. Não é coincidência. Pesquisas científicas confirmam o que monges e curandeiros do Oriente já sabiam há séculos: o corpo se cura melhor quando a mente colabora.

Um estudo publicado na Revista Brasileira de Medicina do Esporte (2022) demonstrou que atletas submetidos à acupuntura durante o processo de reabilitação apresentaram redução significativa da dor e do tempo de recuperação em comparação aos tratamentos convencionais. Outro levantamento, realizado pela Universidade de Pequim (2019), mostrou que a aplicação de técnicas de moxabustão e eletroacupuntura melhora a circulação periférica, acelera a regeneração muscular e diminui a inflamação pós-lesão.

A ciência começa, pouco a pouco, a decifrar a linguagem poética do Qi, a energia vital descrita pela medicina tradicional chinesa. Para os orientais, a dor é um rio que perdeu o curso, e o terapeuta, o jardineiro que desentope os canais. Já no esporte, essa metáfora ganha carne e movimento: a energia bloqueada se manifesta como tensão, inflamação ou fadiga. Quando o fluxo retorna, o corpo “se lembra” de como se curar.

O fisiologista e professor de reabilitação esportiva, Dr. Ricardo Andrade (USP), resume bem essa integração: “A medicina oriental não substitui o tratamento ortopédico, mas o amplia. Enquanto o Ocidente repara a estrutura, o Oriente restaura o sentido do movimento.” É a diferença entre remendar um músculo e devolver-lhe a música.

A respiração consciente, herdada do yoga e do qigong, também vem sendo incorporada nos programas de fisioterapia esportiva. Estudos do Journal of Sports Science & Medicine (2021) indicam que exercícios respiratórios reduzem o cortisol e melhoram a oxigenação tecidual, acelerando o processo de cicatrização. Quando o atleta aprende a respirar, o corpo aprende a obedecer sem dor.

Em Gramado, entre vinhedos e serras, a metáfora se completa: o corpo humano é como a terra cultivada, precisa de repouso entre as colheitas. A medicina oriental ensina o atleta a respeitar o inverno interno, aquele tempo em que nada floresce, mas tudo se reorganiza por dentro. A cura, afinal, é também um ritmo.

Talvez o futuro da medicina esportiva não esteja apenas nos laboratórios, mas também nos tapetes de meditação e nas agulhas milenares. A força não se mede mais apenas em músculos, mas em equilíbrio. E como diria Lao Tsé, citado por Dóris em sua palestra: “A rigidez é a companhia da morte; a flexibilidade é a companheira da vida.”



Referências (formato ABNT)

BRASIL. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Efeitos da acupuntura na recuperação de lesões musculares em atletas. v.28, n.4, p.312–320, 2022.

UNIVERSIDADE DE PEQUIM. Clinical observation on electroacupuncture combined with moxibustion in sports injury rehabilitation. Beijing: Peking University Press, 2019.

JOURNAL OF SPORTS SCIENCE & MEDICINE. Effects of breathing training on cortisol levels and recovery in high-performance athletes. v.20, n.3, p.512–519, 2021.

ANDRADE, R. Entrevista concedida ao Projeto “Integração Ocidente-Oriente na Medicina do Esporte”, Universidade de São Paulo, 2023.

LAO TSÉ. Tao Te Ching. Trad. Huberto Rohden. São Paulo: Martin Claret, 2018.

 
 
 

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